A Human Rights Watch (HRW) acusou o governo dos Estados Unidos de manipulação política e deturpação de informações no relatório anual de direitos humanos divulgado nesta terça-feira (12). Segundo a ONG, o documento do Departamento de Estado teria omitido ou minimizado violações ocorridas em países alinhados com Washington e exagerado problemas em governos que a Casa Branca critica.
A HRW aponta que o relatório ignora abusos em países considerados aliados, como El Salvador, Hungria e Israel. Em contrapartida, afirma que o texto apresenta dados que sugerem piora nas condições de direitos humanos em nações criticadas pelos EUA, incluindo Brasil e África do Sul.
O informe do Departamento de Estado, obrigatório desde 1974, serve oficialmente para orientar a política externa norte-americana em relação a países com “padrão consistente de violações graves de direitos humanos internacionalmente reconhecidos”. A HRW diz que, na edição deste ano, categorias como direitos de mulheres, pessoas LGBTQIA+ e pessoas com deficiência teriam sido removidas de revisões anteriores.
Brasil
No caso do Brasil, com dados referentes a 2024, o relatório indica piora na situação dos direitos humanos. O documento destaca medidas tomadas no âmbito de investigação do Supremo Tribunal Federal (STF) contra grupos organizados na internet acusados de atacar o sistema eleitoral e advogar golpe de Estado. O texto do Departamento de Estado aponta restrições ao acesso a conteúdos online classificados como prejudiciais à democracia, com impacto desproporcional sobre apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Paralelamente, a Procuradoria-Geral da República acusa Bolsonaro de pressionar comandantes militares para suspender o resultado da eleição presidencial de outubro de 2022, quando perdeu para Luiz Inácio Lula da Silva. A investigação teria identificado planos para prender e assassinar autoridades públicas; os acusados negam as acusações.
Israel
A HRW critica o relatório por não mencionar deslocamentos forçados em massa de palestinos na Faixa de Gaza, nem a utilização da fome como arma de guerra. A organização também afirma que o texto deixou de registrar a privação de água, eletricidade e assistência médica à população de quase 2 milhões de habitantes e os danos extensivos à infraestrutura civil, incluindo residências, escolas, universidades e hospitais.
El Salvador
Organismos internacionais e ONGs têm denunciado em El Salvador prisões arbitrárias, julgamentos em massa sem defesa adequada, manutenção de um estado de exceção com suspensão de direitos e perseguição a jornalistas. O relatório oficial dos EUA, porém, afirma que não há relatos confiáveis de violações significativas no país do presidente Nayib Bukele.
El Salvador tem cooperado com os Estados Unidos no recebimento de imigrantes deportados em troca de assistência financeira e compartilhamento de informações de inteligência. Recentemente, o país aprovou alteração que permite reeleição ilimitada do presidente, medida vista por críticos como um fortalecimento do poder do chefe de Estado.
Hungria
A HRW também aponta omissões sobre a Hungria. Segundo a organização, o Departamento de Estado deixou de registrar esforços do governo húngaro para enfraquecer instituições democráticas e o Estado de direito, incluindo restrições à sociedade civil e à mídia independente, além de abusos contra pessoas LGBTQIA+ e migrantes.
África do Sul
O relatório dos EUA aponta piora nas condições de direitos humanos na África do Sul em 2024. O documento destaca a sanção, em 20 de dezembro, do Projeto de Lei de Expropriação (B23-2020), que permite desapropriação sem indenização em casos de propriedades consideradas ociosas. O governo do presidente Cyril Ramaphosa defende a lei como medida para corrigir desigualdades territoriais herdadas do apartheid. Nos últimos meses, a África do Sul também foi alvo de acusações e narrativas negativas em setores do governo norte-americano, incluindo alegações controversas sobre “genocídio branco”.