O projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios Alagoas e financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), tem promovido mudanças em comunidades rurais do semiárido nordestino por meio da valorização da cultura alimentar e do turismo de base comunitária.
Implementado a partir de uma articulação com o BID em 2018, o programa passou por três anos de desenvolvimento. No primeiro ano foram realizadas pesquisas exploratórias nos territórios, com levantamento de dados junto a instituições, universidades, secretarias estaduais de turismo e agricultura e ao Sebrae em Sergipe, Alagoas e Pernambuco. Um comitê técnico definiu 20 critérios para seleção de territórios e comunidades; técnicos da Embrapa visitaram as localidades antes das escolhas finais.
Foram identificados cinco territórios e seis comunidades beneficiadas. Em Alagoas, o projeto atuou com a Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa (Coopcam) de Palmeira dos Índios, na região da Serra da Barriga, e no Assentamento Nova Esperança, em Olho D’Água do Casado, a partir de articulações com municípios vizinhos como Piranhas e Delmiro Gouveia. Nessas áreas, há produção agroecológica e sítios arqueológicos catalogados pelo Iphan, além de práticas de pesca artesanal no Rio São Francisco.
Em Sergipe, as ações alcançaram comunidades em Indiaroba, cuja economia local envolve a coleta de mariscos e frutos da restinga como mangaba, murici e araçá, e também a região metropolitana de Aracaju, em São Cristóvão, onde se destacam a produção do beiju e doces tradicionais ligados à história culinária local. Em Pernambuco, o projeto trabalhou no manguezal da área de proteção ambiental de Guadalupe, envolvendo a Associação das Marisqueiras de Sirinhaém (Aver-o-Mar) e a Associação Quilombola Engenho Siqueira, em Rio Formoso — grupos que compartilham recursos naturais do manguezal e práticas de pesca e agricultura agroecológica.
As intervenções envolveram oficinas, intercâmbios e imersões com moradores, mobilizando diretamente mais de 500 participantes e alcançando um impacto estimado em mais de cinco mil pessoas na região. Entre as iniciativas estão ações para agregar valor a produtos locais, diversificar fontes de renda e organizar atividades de turismo de base comunitária.
Na comunidade de Terra Caída de Indiaroba, a Associação das Mulheres Empoderadas passou a desenvolver oferta turística e produtos locais que ampliaram as oportunidades econômicas. Uma das integrantes criou um hambúrguer feito com carne de aratu, ingrediente típico da região, e conquistou o prêmio Mulher de Negócio na categoria Microempreendedora Individual, concorrendo com 150 mulheres do estado de Sergipe. Outros produtos locais que receberam atenção técnica incluem biscoitos de capim-santo e de batata-doce, preparos à base de mangaba (geleias, cocadas, compotas, bolos e pudins) e mariscos.
No assentamento Olho D’Água do Casado, as ações focalizaram também o fortalecimento da agricultura familiar, a ampliação de atividades geradoras de renda e o envolvimento de jovens do território. A presença de instituições e instituições de ensino na região contribuiu para ampliar oportunidades locais sem obrigar a saída para centros urbanos. Projetos com o Iphan incidiram sobre proteção do patrimônio e o aproveitamento sustentável dos recursos locais, enquanto iniciativas de artesanato passaram a utilizar insumos e saberes da caatinga, incentivando a preservação da biodiversidade e o cultivo de árvores nativas.
O trabalho nas comunidades evidenciou a predominância do protagonismo feminino: mulheres rurais assumiram lideranças em associações, na coordenação de trilhas e vivências turísticas e na organização da produção artesanal e agroecológica.
Além do desenvolvimento de produtos e da atividade turística, o projeto documentou conexões culturais entre alimentos locais e suas origens históricas. No Quilombo Engenho Siqueira, por exemplo, a preparação do funje — uma papa à base de farinha de mandioca que acompanha pratos caldosos — foi associada à herança angolana, reforçando laços entre práticas alimentares e identidades culturais.
A proposta da Embrapa com Paisagens Alimentares é, portanto, integrar valorização da biodiversidade, cultura alimentar e turismo de base comunitária como estratégia de desenvolvimento territorial, com foco na geração de renda, na preservação ambiental e no fortalecimento das comunidades rurais.