Projeções internacionais e dados nacionais apontam crescimento da carga de câncer nas próximas décadas e desafios de acesso e equidade no Brasil.
A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), projeta 35 milhões de novos casos de câncer em 2050 no mundo. No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima cerca de 700 mil novos casos por ano para o triênio que termina em 2025. Em mais de 600 municípios brasileiros, o câncer já aparece como a principal causa de morte.
A maior parte das mortes por câncer ocorre em países de baixa e média renda, segundo levantamentos globais, o que evidencia desigualdades no acesso a ações de prevenção, detecção precoce e tratamento. Fatores comportamentais e ambientais — como tabagismo, consumo de álcool, obesidade, padrões alimentares inadequados, sedentarismo e poluição — são apontados como determinantes importantes na ocorrência da doença, enquanto a contribuição genética é relativamente menor.
No Brasil, a rede de atenção primária do Sistema Único de Saúde (SUS) cobre cerca de 150 milhões de pessoas, formando a maior rede do tipo no mundo. A atuação, porém, é marcada por forte heterogeneidade territorial. Há concentração de serviços especializados e tecnologias de diagnóstico e tratamento nas regiões Sul e Sudeste, ao passo que municípios do Norte e Nordeste enfrentam dificuldade para oferecer atendimento oncológico complexo.
Avanços biotecnológicos como imunoterapia têm ampliado opções terapêuticas, mas medicamentos altamente especializados apresentam custos elevados, muitas vezes impossíveis de serem incorporados em larga escala por sistemas de saúde de países em desenvolvimento. Nesse contexto, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) atua na avaliação prévia de novas tecnologias, exigindo comprovação de custo-efetividade e disponibilidade orçamentária para recomendação de incorporação. O modelo da Conitec foi inspirado em práticas observadas em outros países, como o Reino Unido.
A legislação brasileira determina que o tratamento oncológico deve começar em até 60 dias a partir do diagnóstico. O cumprimento dessa norma esbarra em problemas estruturais, entre eles a pulverização de responsabilidades de saúde entre mais de 5 mil municípios. Propostas de regionalização preveem a organização de unidades em cerca de 400 regiões de saúde, com maior autonomia administrativa para contratação de equipes e compras, como forma de reduzir desigualdades e ampliar a oferta de especialistas e serviços multiprofissionais.
Programas de rastreamento organizado continuam essenciais para detecção precoce. Rotinas de triagem costumam focar câncer de colo de útero, colorretal, mama e próstata, com exames realizados na atenção básica e encaminhamento para serviços especializados quando necessário. Tecnologias de telessaúde e telemedicina vêm sendo utilizadas para reduzir distâncias entre médicos de família e especialistas. Ferramentas de inteligência artificial também têm sido empregadas para aumentar a acurácia de laudos diagnósticos, sempre com a exigência de revisão humana.
A desinformação nas redes e a circulação ampla de conteúdos digitais, incluindo produções geradas por inteligência artificial, são desafios adicionais à comunicação em saúde. A transparência e a qualidade dos dados são apontadas como essenciais para campanhas de prevenção e políticas públicas. O controle do tabagismo no Brasil é frequentemente citado como um caso de sucesso: a prevalência de fumantes adultos caiu de níveis superiores a 30% para cerca de 10% nas últimas décadas, com medidas que incluíram proibição de propaganda e ações educativas em escolas e serviços de saúde.
Entre os temas em debate nas políticas públicas estão questões regulatórias relacionadas à publicidade de bebidas alcoólicas e de alimentos ultraprocessados, além de estratégias intersetoriais para enfrentar determinantes sociais e ambientais do câncer.
