Várias mulheres denunciaram supostas práticas irregulares da agência de modelos Brain, em Brasília, após pagar por serviços de agenciamento e não receber as oportunidades de trabalho prometidas. Ao menos 10 clientes já ajuizaram ação cível contra a empresa, que tem prazo até a próxima semana para apresentar defesa.
O caso mais relatado envolve Ana*, 28 anos, que em junho recebeu contato via rede social para integrar o casting da agência. Segundo a queixa, ela foi orientada a pagar cerca de R$ 2 mil para que um agenciador divulgasse suas fotos a potenciais clientes. Ana alega ter utilizado até o cheque especial e que o único trabalho apontado foi uma sessão para uma loja de óculos, cujo cachê de R$ 700 teria sido abatido do valor cobrado pelo agenciamento. Depois disso, não teria havido novas oportunidades.
Outras jovens relatam experiência semelhante. Elas passaram a se comunicar por um grupo em aplicativo de mensagens intitulado “Enganados pela Brain” e encontraram relatos com padrões parecidos: cobrança de valores antecipados, promessa de trabalhos frequentes e ausência de convocações para novos serviços.
Relatos reunidos pela reportagem indicam variação nos valores cobrados. Em um dos casos, uma jovem de 25 anos teria parcelado R$ 1,3 mil; em outro, uma contratante pagou R$ 5 mil por um pacote que incluiria trabalhos para ela e para o filho de 8 anos, mas, segundo a reclamação, teve apenas um serviço efetivado. Também houve denúncia de proposta de pagamento adicional de R$ 5 mil para supostamente aumentar a visibilidade nas redes sociais, valor que não teria sido quitado em um dos casos.
Uma ex-funcionária da agência informou ter atuado na captação de modelos e relatou que havia orientação interna para recrutar grande número de perfis, inclusive por meio de abordagem em shoppings e redes sociais. Segundo essa fonte, a prática de elogiar perfis teria sido utilizada como técnica de convencimento.
No fórum judicial, o grupo de clientes pede a rescisão dos contratos e a devolução dos valores pagos. O processo coletivo soma cerca de R$ 53 mil. Até o momento não houve registro de tentativa formal de conciliação entre as partes.
Do ponto de vista criminal, o advogado Jaime Fusco avaliou que as condutas narradas podem configurar estelionato, por promessa de emprego não cumprida, e recomendou que as denúncias sejam encaminhadas à polícia especializada em fraudes e ao Ministério do Trabalho para apuração administrativa.
A defesa da Brain, por meio de seu advogado, negou a existência de promessas de emprego e afirmou que os contratos assinados esclarecem não haver garantia de trabalho. A empresa também emitiu posicionamento afirmando não ter sido intimada para responder às ações movidas contra ela e negando que tenha orientado funcionários a abordar 100 pessoas por dia ou a incentivar a compra de seguidores em redes sociais. Segundo a agência, o que houve foi recomendação interna para estratégias legítimas de crescimento digital.
A Brain declarou ainda manter contrato de prestação de serviços com a loja de óculos Oculum, renovado por quatro períodos consecutivos, recebendo remuneração mensal fixa para criação de material de marketing e para ações com influenciadores. A agência afirmou que os agenciados aprovados recebem créditos em óculos ou podem abater esse valor no investimento de agenciamento e reiterou que cumpre suas obrigações contratuais.
*Nome fictício a pedido das entrevistadas.